segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Luiza e o Teto

Luiza minha filha é brava.
Nos dois sentidos: nervosa, meio selvagem e corajosa, intrépida.
Não há nenhum obstáculo capaz de detê-la se resolve fazer alguma coisa.
Esse final de semana juntou-se a outros jovens para um trabalho voluntário numa ONG chamada " Um Teto para Meu País" (http://www.umtetoparameupais.org.br/).

Esse grupo nasceu no Chile, fundado em 1997 por um grupo de jovens sensibilizados com a situação de pobreza e miséria em que viviam milhões de pessoas e traçaram programas de construção de casas emergenciais visando, a partir disso, introduzir planos de reabilitação social. Essa ONG surgiu no Brasil em 2006 em São Paulo e já envolve centenas de jovens e comunidades carentes, tendo já sido entregues mais de 200 casas na região de Guarulhos, Suzano, São Paulo e Itapeva.
Pois assim foi que Luiza saiu daqui na sexta-feira a noite, depois do seu trabalho, em assessoria de imprensa, que lida com clientes potencialmente voltados ao consumo de bens de luxo e despencou, com outros jovens para a divisa de Osasco com SP.
Nessa primeira etapa a meta era entrevistar o maior número de pessoas da comunidade para depois, tabulados e analisados os dados, serem selecionadas as famílias em maior necessidade para receber a casa emergencial de 18mts quadrados. Sim, não está errado, 18mts quadrados, de madeira.
A menina que sai sempre linda, perfumada e cheia de estilo nos seus finais de semana para passeios, baladas e cinema com os amigos transformou-se.
Ontem, na volta desse voluntariado, encontrei uma linda moça melancólica, séria e perplexa depois de 2 dias dentro de uma favela situada à beira das 2 Marginais...
Andou entre a tristeza, a miséria extrema, colocou no colo crianças picadas por insetos e seminuas, ouviu relatos de violência doméstica, desemprego, familias de 8 pessoas vivendo com metade de um salário mínimo, fome, medo e abandono. Entre esgotos, barracos construidos sobre esgotos, andou ao lado de ratos, sujeira e infecção.
E como seu olhar agora amadurecido diante da dor do mundo, Luiza me falou do carinho e generosidade com que foram recebidos, cafés e bolos oferecidos, talvez os únicos das famílias, e dos abraços, dos agradecimentos e da muita esperança de mudança. E nenhum registro de violência ou tensão contra esses jovens caminhando entre os barracos.
Luiza se fez a mesma pergunta que os de bom coração sempre fazem: por quê?
Por quê uma vida tão abaixo da dignidade?
Importante nisso tudo, Luiza, apesar da indignação e horror, decidiu que não adianta só falar, falar, que dá para fazer um trabalho, de formiguinha, para tentar amenizar essa imensa injustiça.
Um pouco de cada um, algumas horas, um pouco de ajuda financeira, divulgação, enfim, tem como ajudar e só querer.
Depois que tomou seu banho quente ( estava muito suja, pois ficaram essas 48hs alojados numa espaço comunitário sem acesso a banho) e jantou, ainda conversamos muito tudo o que ela viu e ouviu.
Ali, naquele instante percebi uma menina que cresceu, que olhou o seu lindo quarto e prato de comida quente com outros olhos. Vi a esperança renascida em outro jovem coração, esperança de um mundo melhor e mais justo.
E como Luiza é brava, sei que vai continuar esse e outros trabalhos e tenho certeza, conseguirá alguns resultados. Coragem e temperamento não lhe faltam.
Fiquei pensando em tudo que escutei, em tudo que conheci e li pela vida e mesmo em momentos tão complicados como o que atravesso, voltei a acreditar que o sonho de mudar, de melhorar, de alterar o planeta e as pessoas é sempre possível, pelo menos enquanto existirem os jovens.

Para Luiza, que redimensiona o que chamo de " problemas".

Um comentário:

  1. É querida, essa é a indignação dos que agem, dos que diante da Injustiça, com "J" maiúsculo; sentem compaixão (sofrer junto)pelo padecer do outro. A caridade não é apenas nos desfazermos do que está sobrando, é compartilhar o que possuimos.
    Parabéns para Luiza e para o grupo a que ela se juntou.
    Isso de fato redimensiona nossos problemas.
    beijo,
    Lia

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