segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Mais chuvas





"...Amores do passado, no presente
Repetem velhos temas tão banais
Ressentimentos passam com o vento
São coisas de momento
São chuvas de verão..."
( Chuvas de Verão-Fernando Lobo)

Tempos atrás, bem atrás, reencontrei uma pessoa que tinha sido "única" em minha vida.
Fiquei muito impressionada num primeiro momento.
Primeiro, a memória de tempos tão ricos e vividos com tanta intensidade, trazidos assim, de volta, de repente, me atingiu como uma onda de enorme alegria. Em segundos pude sentir de novo a mesma e estranha paixão que teve vida bem curta...
Lembrei da frase de Philip Dick em " Do androids dream of eletric sheep?" (livro que deu origem ao filme Blade Runner) " a luz que brilha com o dobro da intensidade dura a metade do tempo"...
E ainda assim, nesse " esbarrão" com essa pessoa, pude sentir de novo essa luz...
Segundo momento, junto com essa lembrança de tanta beleza também veio a dos momentos tristes que nos levaram à ruptura. Nossas diferenças, nossos medos, nossos sonhos díspares.
E foi então que me vi, não sem perplexidade, diante de um estranho!
Corte de cena. Mais tempo passando...
Esse tema retornou dias atrás, a mesmíssima fábula, mesmo enredo, outros personagens, agora um amigo nesse mesmo momento.
E foi aí que percebi algo bem interessante: como nossa memória, anestesiada pela fantasia, pode nos criar uma armadilha perigosa: a de só recordarmos os " bons momentos".
Imagino que o amigo não tenha vivido, por ser fato muito recente, o "luto" necessário desse amor perdido ou não bem sucedido. E por essa dor, embutida, lacrada, sem saída, ainda tente enxergar todo belo e harmonico que havia.
O mergulho profundo na perda, o choro e ranger de dentes de certa maneira são necessários, nos resgatam e acabam nos jogando, mesmo que aos pedaços, para frente.
Fiz, nesse dia, um papel que não gosto. A do " Grilo Falante", e trouxe de volta, não sem me sentir uma fdp, as brigas, diferenças e sofrimento vividos pelo amigo nesse relacionamento.
Aos poucos, como se acordasse de um sonho bonito, ele foi, ali, sofrendo de novo e imagino que tenha percebido que era chegada a hora de tirar do rosto os óculos cor-de-rosa.
Lembrei da linda canção do Fernando Lobo, que Caetano Veloso gravou com genialidade, "Chuvas de Verão"...Cantarolei um pouco e o amigo sorriu.
Sou meio expert nisso, no mínimo me casei 3 vezes, fora o resto...rs...portanto tenho aprendido a lidar com "recaídas" e sei quando estou enxergando apenas o que quero enxergar.
Acho que crescer é meio isso. Viver fantasias e saber que são fantasias.
Lindas, delicadas, cheias de luz e força, mas fantasias.
Um outro poeta, Cazuza, pode ter encontrado a chave e quem sabe, por aí, a gente consiga viver, todos os dias, um grande amor. De verdade, feito de bons e maus dias, de alegria e dor, mas ainda amor que vale a pena.

"E ser artista no nosso convívio
Pelo inferno e céu de todo dia
Pra poesia que a gente não vive
Transformar o tédio em melodia "
( Todo amor que houver nessa vida- Cazuza)


Boa semana.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Unidos venceremos!





Precisou de muito, ou de pouco se pensar bem, para descobrirmos como fazer isso.
Começamos com a delicada percepção nas décadas de 60 e 70, de que algo estava muito errado, ordens e verdades vindas de cima para baixo, não aceitávamos mais. E toda uma geração questionou e enfrentou os pais e mundo estarrecidos.
Assumimos nosso corpo que queria fazer amor sem aliança no dedo ou compromisso, nossa mente, expandindo-a com alucinógenos ou suaves baforadas ao som da até então desconhecida música do oriente. E ao som dos Beatles e Stones e de todo aquele povo incrível de Woodstock. Usamos a flor, o poder do amor e nos unimos para queimar bandeiras contra guerras que não eram nossas e que nunca aceitamos.
Depois, com vaga consciência e muita vontade, caímos na clandestinidade, imprimimos panfletos, lemos Marx e propusemos, de maneira meio atabalhoada, o conflito e a divisão do país entre " eles" e "nós". Perdemos muitos nessa parada, todos.
Depois mergulhamos numa imensa solidão os anos posteriores...
Eram os tempos dos egos inflados dos "yuppies" e suas carreiras criados na lei de cada um por si..Das terapias que diziam que tínhamos que ser " nós mesmos" apesar do outro ou outros...Tempo do dinheiro e consumo.

Foi então que algo mágico aconteceu!
Um grupo de jovens, só poderiam ser jovens, pegou algo totalmente mental, quase apenas uma idéia, o cyberespaço e criou as "redes"..
Ah! que coisa mais cheia de poder e magia...
Esse fio invisível, sem começo nem fim, aparentemente preso numa simples tela e teclado, nos uniu a todos, ao mundo, para sempre!
E lutamos juntos pela preservação das baleias, dos golfinhos, das matas e florestas...Por Sekineh, pelas eleições, pelos cães abandonados, pelos cinemas que iriam ser destruídos, pelas vítimas dos incêndios e enchentes.
Concordamos e discordamos, protestamos e demos aval, pudemos nos expressar, chorar, rir...
Trocamos músicas, imagens, pedimos colo e recebemos de volta, dividimos dores e conquistas.
Local de encontros e reencontros, de achar almas gêmeas ou afinidades, em qualquer ponto do planeta, nunca estamos sós!
Pois é, unidos venceremos. Sem sangue, sem confrontos, sem violência. Só unidos.
Bem aquariano, bem a cara de uma nova era que ai está para nos modificar.
Essa rede, hoje tão estudada, tão atraente e poderosa, conseguiu algo que sempre sonhamos. Sermos um e sermos todos ao mesmo tempo.
Bem vinda modernidade usada para o bem e para o bom. Livre, democrática, nos torna cidadãos e nos ensina que há tanto o que fazer para deixar esse mundo melhor.
Sou fã, adoro, sou acolhida e acolho e me sinto fazendo parte desse imenso processo humano.
Lembro da frase de Atahualpa Yupanqui " Yo tengo tantos hermanos que no los puedo contar"...Verdade, tenho mesmo!

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Uma família p/ os Mattos e Rubão




Nós amávamos Campos de Jordão, Solemar. Amávamos Poços de Caldas.
Na verdade amávamos estar juntos.
Éramos uma família, mais uma clã, quase com espírito celta, escocês, que se unia e formava sólido bloco contra possíveis ameaças do mundo.
Nos frios intensos, manhãs geladas e hortênsias ou dias de mar, verão escaldante, Vicente de Carvalho sendo declamado e Pensão Balaton, ou hotéis com cara da velha Europa, esse grupo possuía o dom de ser muito feliz e barulhento e até mesmo o de encobrir faltas e pecados de cada um.
Nossa alegria era contagiante, nossas festas, inesquecíveis.
E nossos pecados eram diferentes, pois nossos pecadores eram mais divertidos que os outros.
E fomos assim por anos e anos.
Primos criados entre primos, sob o olhar orgulhoso dos velhos que sempre sonhavam que virássemos uma família só, casando entre si, guardando somente entre nós as nossas dores, os nossos medos e o nosso sucesso e felicidade.
E depois, fomos enterrando nossos mortos com dignidade, com um enorme orgulho de quem dá adeus a guerreiros, vencedores, tratando, a partir dessas perdas, de manter viva a memória e história para os mais jovens que chegavam...
E em todos os invernos, quando ríamos por entre os plátanos e bosques de Campos, na casa da Dulce, do Mota Bicudo e em todos os verões na " casona" ou nos 3 Pinguins, com jogos de cartas noite adentro, maços de cigarro entupindo cinzeiros e bailes de carnaval, forjamos nossa maturidade, hoje quase velhice.
E nossos velhos, aqueles que criaram essa clã, essa quase " famiglia" nos moldes sicilianos, atingiram um estágio incrível, quase como os heróis de Argos: embora mortos, estão vivos para sempre.
Não mais erros, pecados, fugas reais e imaginárias. Tudo foi devidamente entendido por nós como mostra da enorme humanidade e coragem de nossos pais e avós.
Hoje publico fotos dessa quase casa real, atrídica e bela a que pertenço, nas redes sociais. E compartilho com os que não os conhecem, mas principalmente com os que remanescem como guardiães eternos de suas vidas e feitos.
E assim vou eu agora, entrando na derradeira parte de minha vida, sem me sentir só, pois a presença de todos eles circula, leve e em transparências iluminadas, pelos corredores de minha casa, de minha memória, de meu coração.

Para os Mattos. Para Rubão.

Bom final de semana.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Culpa de quem?






As anunciadas chuvas de verão, com seu rastro de tragédia, já começaram.
São Paulo e cidades que fazem parte da Grande São Paulo mais a região serrana do Rio de Janeiro contabilizam seus mortos e estragos de todos os tipos.
Nenhuma novidade, é a famosa " crônica da morte anunciada". Os governantes seguem agindo da mesma forma e, sorry, a população idem.
Isso me fez extrapolar um pouco o tema, para ficar com a questão " atitude".
É o lengalenga costumeiro, sempre procuramos culpados para tudo que nos acontece de ruim.
Para os governantes é o aquecimento global ou construções sem controle, para o povão é o governo ou o partido que está no poder (no momento) que não fazem nada.
E no nosso caso? Se estamos tristes, infelizes, desmotivados, há de ter sempre uma justificativa que não nossa incompetência, arrogância, descaso e falta de senso, para mandar a conta.
Por que será que insistimos em não assumir o que somos e fazemos?
No caso das chuvas, ainda que pese a irresponsabilidade governamental, as mudanças climáticas, quem vai assumir o " mar de pets" que entupiu o Rio Pinheiros? Ou seja, quem jogou afinal aquele lixo, não só no rio, mas nos córregos, nas ruas, nos bueiros e até pelas janelas dos automóveis?
Pois é.
Pegue uma coisa do cotidiano. Nosso companheiro/a não está bem, parece meio distante, sem querer conversa.
Será que vamos parar para pensar no que estará acontecendo de fato com ele/a? Onde e como colaboramos para isso? Não, nossa tendência é fechar o diagnóstico creditando apenas ao outro esse estado depressivo.
Nunca erramos, somos semi deuses, perfeitos e sempre com um visão impecável sobre tudo, agora os outros, coitados, todos um bando de mal resolvidos.
Acabamos nos tornando " ilhas" sem contato com nenhum continente.
E assim, a cada dia, vamos ficando mais e mais sós, vendo distancias serem aumentadas e as relações entre pessoas virarem formalidades.
O que é preciso para mudar?
Humildade, muita humildade, afinal vou ter que colocar minha cara à tapa, sair do pedestal, largar os discursinhos de frases feitas e, de peito aberto, reconhecer minhas falhas, minha fraqueza, meu engano, minha atitude não cooperativa.
Depois é tratar de modificar o que andou causando o transtorno.
Penso que só assim a gente vai poder, de verdade, cobrar alguma coisa pois, pelo menos, a nossa parte foi feita.
Jogar lixo, entupir rios, o descaso e a desqualificação com o outro, qualquer outro são faces da mesma moeda.
E a conversa indignada que se segue, idem.
Todos somos responsáveis, de A a Z. Pelo planeta, pelas cidades, pelo meio ambiente, pelo amado, pelos amigos, pelos afetos e pela nossa felicidade.
Afinal das contas o único que goza do dom da " Infalibilidade" é o Papa!
E sabemos muito bem que esse cavalheiro está quase sempre muito distante disso!

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Uma frase




Começando o ano, recebi do meu jovem e querido amigo, músico e agora poeta, Caio Nazaro, a letra de uma canção, linda, que, em sua generosidade, compartilhou comigo.
Pincei uma frase para esse blog

"Sou feito daqueles detalhes
Que você deixou passar..."

Falar pra mim, virginiana empedernida, em detalhes, é quase que tratar da essência de minha vida e pensamentos. Li, não sei onde nem de quem, que Deus está nos detalhes e isso me faz muito sentido.
Pois é, quantos de nós, nessa longa jornada vida afora, não deixou escapar detalhes. Do outro, de coisas que nem sempre foram ditas, apenas insinuadas, dicas sutis e mesmo uma análise mais acurada de quem somos e quem é o outro.
O macro é forte, gestos, palavras eloquentes, discursos e posicionamentos, gostos e escolhas, tudo muito marcante, trazendo a ilusão de que não há nada mais atrás disso.
Há. Detalhes.
Um olhar, uma pausa, um segundo de silêncio pode mudar tudo.
E quantos amores foram encerrados por pequenos mal entendidos, mágoas sutis, pequenos assassinatos...E normalmente o causador do estrago sequer percebe.
Há em mim, em nós, todo um mundo feito de coisinhas pequenas, sensações indescritíveis, dados importantes que não aparentam ser, necessidades tão delicadas que acabam passando em branco..
E aí? Aí fica como o querido Caio colocou " detalhes que você deixou passar"...
Fico pensando, traçando analogias bem bobas, o que faz um vestido, qualquer um, com tecido, aviamentos, forro e modelo, ser considerado um traje de " alta costura"? O acabamento, os pontos, mínimos, juntinhos, sem serem percebidos que une tudo, ou seja, detalhes. Ali está a arte, a maestria, o refinamento que torna aquela uma peça única.
Ok, tenho me perdido inúmeras vezes nisso, perdendo tempo e a visão do todo, mas sei, sinto que, pelo menos para mim, não há como viver por cima, na superfície, só no grande esboço.
O amigo que não me liga cumprimentando pelo ano que chega, alguém que corre e fecha a porta do elevador para que eu não entre, o olhar perdido e sem atenção quando conto alguma coisa, tudo isso pesa, machuca, mágoa, embora seja um detalhe, mal educado.
Por outro lado e com a mesma força, receber um e-mail de alguém que soube que não andava bem, ou cópia de uma foto que sai bonita, um recado no facebook, me faz imensamente feliz.
Ah...receber a letra e música do Caio, sutil e delicada demonstração de afeto e confiança é outra dessas coisas, pequenas, que tem o maravilhoso poder de tornar o dia, a semana e ano que começa, repletos de uma sensação gigantesca de felicidade e esperança.

Bom ano para todos.

Para Caio, com afeto enorme.