segunda-feira, 26 de abril de 2010

Fio da Navalha




A Medicina, assim com M maiúsculo, aquela que é de verdade, que pesquisa e não é mercantilista, fala de doenças de difícil diagnóstico: Lúpus, Doença de Crohn, Mal de Addison, Porfiria, cisticercose, câncer de pâncreas, entre outras.
São diagnósticos muito complicados de se chegar e acabam dando verdadeiros bailes nos pobres clínicos, às vezes por apresentarem sintomas de outras tantas e mais comuns moléstias, noutras pela falta dos mesmos até que surja algum devastador...

Existem também outras doenças, comuns, descomplicadas em relação aos sintomas, conhecida por muitos, mas de diagnóstico igualmente difícil.
O alcoolismo.

Ninguém se assombra, nem fica em estado de alerta, ao ver alguém tomar seu aperitivo de final do dia, sua caipirinha junto com a feijoada ou o chopp entre amigos. Mesmo que os tais aperitivos sejam mais que 1, 2, ou a tal caipirinha vire 2,3...Ninguém se espanta.
Nossa atitude é de enorme tolerância mesmo diante de alguns excessos cometidos entre amigos, pileques, discussões, vozes alteradas e uma nitida incapacidade para falar, andar ou mesmo dirigir um carro. Ou ficamos bravos quando a coisa é chata, mas logo perdoamos o " bebum saliente" ou achamos graça se for um bebum bem humorado.
Vamos incorporando, sem perceber, as tais bebedeiras e acabamos catalogando como personalidades polêmicas, folclóricas ou ainda justificando as mudanças como " cansaço", baixo astral, semana ruim, momento difícil, etc...
Parece palavrão falar em Alcoolismo...Para quem sofre dele e para quem suporta ao lado.
Segundo pesquisa na Internet:

O alcoolismo é o conjunto de problemas relacionados ao consumo excessivo e prolongado do álcool; é entendido como o vício de ingestão excessiva e regular de bebidas alcoólicas, e todas as conseqüências decorrentes. O alcoolismo é, portanto, um conjunto de diagnósticos.



Fazem parte dessa quadro a Tolerância e a Dependência.
Não preciso falar disso, todos, de alguma maneira, sabem do que se trata.
O que quero falar aqui é da enorme, enorme dificuldade que percebo em se olhar assim, cara a cara, o problema, sem mecanismos intelectuais que criem uma argumentação poderosa como justificativa.
Como perceber que o inocente prazer de um aperitivinho num sábado na praia deixou de ser só isso, pois a pessoa cai de bêbada, fica agressiva, inconveniente e depois nem se lembra da presepada que aprontou? Como enquadrar aquela pessoa bela, culta, inteligente, que admiramos, que conversamos, que temos tanto em comum num quadro de dependência, mesmo que ela não passe um único dia sem tomar algumas doses e jure que consegue párar quando quiser?

É mais fácil se lidar com um diagnóstico de doença terminal do que com alcoolismo...
Será que nossos preconceitos, nossa aparente conivência ( afinal a gente também gosta de uma biritinha de vez em quando...), nos impede de ver, de enxergar e, lógico, lutar contra?
O alcoolismo estigmatiza. Quando pensamos nele logo criamos a imagem do farrapo humano jogado nas calçadas, embaixo das pontes, enrolado em trapos!
Não é verdade, ou é apenas parte dela, pois esse certamente poderá ser o caminho de quem sofre com isso e não busca ajuda ( uma total deterioração social, moral, física e mental).
Conheço e conheci ex-alcoólicos médicos, artistas, músicos, homens de fortuna e educação, mulheres bacanas, belas, cultas, em todas as classes sociais, enfim...
Com alguns casos em minha família posso dizer, me perdoem se vou soar piegas ou com alguma conotação religiosa, viver próxima ao alcoólico é um inferno e o efeito é igualmente destruidor...E não há força nenhuma do mundo que os faça buscar a saída se não quiserem, se não assumirem, para si mesmos, que tem um problema.
É como caminhar no fio da navalha. Todo o tempo.

Nunca, mesmo tendo uma vivência próxima ( com minha mãe, que bebeu muito por anos e anos e um dia, quase no fundo do poço, foi buscar terapia e saiu dessa) fiz parte da liga anti-alcoólica, Não sou estraga-prazeres, nem fico pregando sobre os malefícios do mesmo, aliás adoro minha cerveja gelada, uma caipirinha bem feita e um bom vinho siciliano.Mas não tenho problema algum com isso pois não dependo de bebida para ser feliz, cantar, rir ou enfrentar perrengues. Aliás de cara "limpa" é mais produtivo pelo menos no meu caso!
Hoje vejo que não tenho, também, nenhuma dificuldade em " perceber" quando alguém está passando dos limites.
Mas observo, apenas para maior reforço e reflexão, que é muito complicado para a grande maioria das pessoas ou enxergar quem precisa de ajuda ou olhar para si mesma e descobrir que algo não vai bem, pois está buscando escape, alegria ou diversão num estado químico.
Falando, outro dia, com grande amigo que viveu e superou o terror do alcoolismo, me dizia ele que a pior parte é essa, a aceitação de que era um alcoólico, pois, ao contrário até mesmo de outros dependentes químicos ( drogas, analgésicos, etc), não havia nenhum glamour ou charme nisso, era feio, era baixo, se sentia quase um desclassificado.
Pois é, gente, assunto chato para uma segunda-feira, mas a vida tem disso, coisas chatas, desagradáveis.
E não vai adiantar a gente fingir que não existem.
O negócio é ficar atento e dar uma parada para pensar quando por acaso a perspectiva de abrir mão do whiskie do happyhour vire uma idéia insuportável, ou se não se conseguir mais curtir uma festa na base da Coca-cola. Ai, pessoal, sinto muito, me parece que é a hora de ligar o sinal amarelo.

ps- site pesquisado nesse blog: psicosite:
http://www.psicosite.com.br/tra/drg/alcoolismo.htm

Um comentário:

  1. Nil querida,
    Que assunto trash de assuntar esse, hein?
    Só para fazer contraponto: lembra do George Burns, aquele ator e comediante americano que estreou seu primeiro papel dramático aos oitenta anos e com ele "papou" o prêmio da academia de melhor ator coadjuvante de 75?
    São dele as frases abaixo.
    Aos setenta anos, ao ser perguntado sobre a sua tolerância ao álcool: - "Para dizer a verdade, basta um drinque para me derrubar. Mas nunca sei se é o décimo terceiro ou o décimo quarto."
    Aos oitenta, ao ser perguntado sobre o porquê de ainda fumar charutos: - "Na minha idade, se eu não tiver algo em que me segurar, eu caio."
    Aos noventa, ao ser perguntado sobre sexo: -"Sexo aos noventa anos é como tentar jogar bilhar com uma corda."
    Pois é, na festa de aniversário de 100 anos, atendendo aos pedidos de 'discurso,discurso', disse apenas: - "Ah! Se eu soubesse que ia durar tanto, tinha me cuidado melhor."
    Beijos.

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