sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Barriga prá dentro, peito pra fora! (ou milicos e sutiãs!)






Retomo o assunto sobre os tempos em que morei no Edifício Casa Branca, Jardins-SP que chamo, carinhosamente, de Dakota, em homenagem às estranhezas e bizarrices que tornaram ambos os imóveis meio parecidos.
Mas nem tudo é tragédia e por um bônus do destino, que me percebeu tão infeliz em morar naquela gaiola dourada, pude viver e participar dos mais ricos e conturbados anos do país (e sua ditadura militar) tendo como cenário, a 5 quarteirões de distancia, a mais famosa de todas as ruas de São Paulo: a Rua Augusta!
Imortalizada em canções, estudos, teses e até hoje viva nas lembranças de quem estava lá e viu e viveu e sobreviveu para contar, essa rua representou um território livre, de conquistas, de desafios, de jovens em estado de ebulição com as ideias vindas de Londres e dos Estados Unidos e sua triste guerra do Vietnã, dos hippies, do flower power, do rock e festivais, dos ativistas e pacifistas e de uma meninada que iria mudar o rumo das coisas!
Ali usei pela primeira vez uma minissaia curtíssima! ( tão curta que não podia me sentar..rs), pois meu pai proibia ( trocava no elevador por outra saia, mais comprida, antes de chegar em casa), ali bebericava uma cuba libre disfarçada de Coca cola, ali nós, meninas e alunas do colégio feminino fino e elitista mostrávamos as pernocas ( enrolando a saia azul marinho do uniforme diante do espelho da loja de molduras que existia quase na esquina da Al. Lorena), ali admirava os motoqueiros em suas jaquetas de couro e suas Harleys roncando, ali fumávamos, ali, ali, ali...
Na Augusta onde tudo acontecia, de músicas ( na Augusta Discos, quase esquina com a Al. Tiete ou na Hi- Fi um pouco para cima lado oposto, com seus lançamentos maravilhosos de rock) às atitudes, mesmo com a vivência, às vezes tão próxima, como no meu caso, da ditadura militar, eu era feliz...
Os milicos, também chamados de "gorilas" ( pobres animais, injustiça isso), tomaram o país numa bobeira do pessoal do poder em 1964 e com mandos e desmandos, permaneceram por décadas.
No  começo meio ressabiados, eles foram ficando mais e mais truculentos e acabaram tomando gosto pelo poder e seus desdobramentos ( infelizmente, parece que fizeram escola pois alguns de seus métodos para determinados " acertos" continuam em uso). Esse pessoal era o contraponto exato ( ouso dizer, necessário) do mundo que queria e iria mudar!
Mas não é disso que quero falar, mas sim do "clima" instalado, com perseguições, proibições das mais variadas e uma sensação de medo uma vez que as liberdades individuais estavam suspensas.
Ainda assim a turma da Augusta seguia em frente e as contravenções sempre são interessantes, justamente por serem contravenções e o pessoal se reunia, ouvia rock, fumava maconha, corria da polícia, os rapazes usavam cabelos compridos e as garotas descobriam o mundo apesar das ameaças, vindas das famílias, de virarem " meninas perdidas"...
Em 1968 aconteceu o famoso episódio da " queima de sutiãs", em Atlantic City, EUA como protesto contra um concurso de Miss América que exigiu maior dignidade e menos opressão contra as mulheres. O sutiã tornou-se, então, o símbolo de opressão e "coisificação" contra mulheres.
Começava ali um movimento que se seguiu a outros tantos e marcou o nascimento de uma " nova mulher" que buscava sua liberdade e que aprendia a lutar por direitos iguais em todos os níveis.
Minha amiga Cristina Magro e eu, habilidosas nas agulhas de crochê, fizemos com linhas e lãs coloridas " sutiãs" ou "tops" cheios de charme e cores que usávamos "por cima" das camisetas Hering que comprávamos na " Meia Pataca"! Era, bem "hippie" e pacífica a nossa maneira de protestar e fazer coro contra os tais instrumentos de opressão, os sutiãs ( que nunca usávamos mesmo..rs).
Muitos anos se passaram desde 1968 e enormes mudanças vieram...
Os anos de protesto foram substituídos por um grande culto ao físico, a aparência, a tal cansativa geração academia... E sinto uma enorme melancolia...
Depois de tantas discussões, enfrentamentos, quebras de paradigmas importantes como contracepção, virgindade, igualdade no mercado de trabalho, sexo sem casamento, aborto, etc, etc, vejo a volta, pelo menos no quesito " sutiã", da " coisificação" da mulher.
Silicones de todos os tamanhos e até mesmo industriais em implantes gigantescos tornaram-se sonhos de consumo de uma parte da mulherada que corre atrás dos seios enormes, os mesmos que na década de 60/70 seriam vistos, com humor, apenas nos filmes de Fellini!
Sutiãs com armação de metal, bojos falsos, " wonderbras", tudo falso para dar a ilusão de fartura são " hits" das revistas, editoriais, moda e consumo.
Acho triste.
Não gosto de sutiãs, nunca gostei. Não tive, nunca, atributos suficientes para isso, mas não os usei nem quando grávida ( e os seios cheios), portanto... Incomodam, apertam e oprimem, independente de qualquer conotação política..rs
Me sinto, entretanto, obrigada pelo olhar inquisitório das novas gerações a esconder o pouco que tenho. Essa moçada me diz que os seios livres não são belos, que não ficam bem e que ficam vulgares sem sutiãs...
Engraçado,é como se escutasse, mais uma vez, o velho discurso de minha mãe e tias nos anos rebeldes!

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