segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Separar dói...



Separar dói. Separações são sempre difíceis.
Não seria diferente quando aconteceu comigo.
Tinha vivido até então aos quase 28 anos, as separações do pior tipo que tem, aquelas causadas pela morte. Perdi meu avó criança ainda e aos 15 minha avó amada e meu tio Walter, dor essa que quase causou uma hecatombe emocional na família.
Agora, separação de marido, meu primeiro marido, pai dos meus meninos foi em 1983.
Casei por amor, por paixão, tenho certeza disso agora e pensei que era para sempre, sem saber que o "prá sempre, sempre acaba" (o poeta ainda não tinha me explicado isso...).
Foi duro, terrível, complicado, aliás, tão complicado que me mudei (com os 2 filhos, a cachorra, 10 periquitos australianos e um pássaro preto) do prédio que morava, o Dakota ou Ed. Casa Branca, escondida de meus pais!
Meu pai, tantas havia feito que comprou ( sem me consultar) um apartamento naquele mesmo edifício de tantas estórias, em outro bloco, só para nos ter por perto, num tempo que eu procurava uma casa para criar as crianças.
Já doente, com o Parkinson começando a devastá-lo cedi sem discutir muito. Até a separação depois de 10 anos de casamento.
Daí para frente não daria mais para ficar "sob as asas" dele e mamãe, nem sob os holofotes controladores do pessoal do Dakota que já dava sinais de comentar a vida da " filha do senador sem marido".
E nesse momento reativei o plano de morar numa casa, precisamente no Brooklin, amado Bronx, onde tinha uma parte da família.
Em questão de dias achamos (eu e prima Flávia) a casa, entrei com a papelada e enchi o caminhão de mudanças. Tudo escondido.
Ao descarregar minhas tralhas, desabei. Chorei muito, sentada na escada do sobrado da Rua Guararapes, sem saber por onde começar.
Sentia que ali nesse novo local, acabava de vez com o meu casamento, pois esse seria um projeto que teria que levar sozinha, por conta e riscos próprios.
Separar é difícil.
Poucos quarteirões moravam, para nossa sorte, minha e dos filhos, além da querida e única tia Concha e família, meus primos Ruy e Maria Elisa, com seus 4 filhos.
Na linda casa deles da Rua Indiana, fui acolhida, mimada, colocada no colo e pude me refazer emocionalmente.
Perceberam os dois, com sua sensibilidade e afeto, que me sentia muito perdida e angustiada. Nossos filhos estudavam no mesmo colégio, fazíamos compras juntas no Ceasa e  eu estava sempre na companhia deles em shows, viagens, festas e eventos.Éramos como uma família só.
Dentre tantos episódios legais que vivemos e pessoas queridas que pude conhecer na casa dos Jardim/Barboza (Ronaldo Parisi, Virgininha e filhas, Bias, Estebán, Enrique Martí e Cris, Dina que virou minha melhor amiga e Dr José Nhaka, Dr Abrão Rapoport e tantos outros), conto aqui um que é bem coisa do Ruy, brincalhão e gozador.
Nos muitos programas que surgiam íamos juntos ou acabávamos no encontrando.
Maria me telefonou certo dia e marcou um encontro a noite no bar Paulicéia Desvairada, acho que esse era o nome, na Rua Pinheiros. Ela estava em outro compromisso e iria mais tarde para lá.
Fomos, eu e Ruy, conversando e rindo como sempre.
No bar ele ia parando de mesa em mesa, era uma celebridade e acho que conhecia metade de São Paulo! Nos sentamos e vejo uma pessoa se aproximar.
Sorridentes, eles se abraçaram e reconheci um jornalista e humorista de rádio muito famoso naqueles dias.
Engraçadíssimo, super simpático, ele me olhou e Ruy imediatamente tascou: Fulano, essa é Nildinha, minha prima! Acontece que falou com um tom prá lá de sacana, dúbio, irônico e, lógico, o humorista não perdeu a chance:
Prima? prima???!!!!sei, sei, entendi.
Rimos muito, cada um por um motivo, Ruy por ter enganado o amigo, esse por achar que tinha descoberto uma possível safadeza de Ruy e eu pelas expressões divertidas dos dois homens. Logo Maria Elisa chegou e nesse momento, que foi o mais engraçado da noite, ela, efusiva e sem saber de nada abraçou o humorista e perguntou: já conheceu a minha priminha?rsrsrsrs!!!!! Inesquecíveis as expressões de espanto dele e de pura marotice do Ruy!
Essa brincadeira era bem a cara e espírito do meu primo e guardo esse episódio com muito carinho na memória.
A alegria, a inteligência privilegiada, talento musical, o humor fino e cortante e principalmente o carinho que sempre me dispensou tornam essa morte uma perda dolorosa.
Nos anos seguintes, depois de tantas coisas, ele e Maria se separaram, Ruy sofreu aquele atentado horrível no Rio, eu me separei de novo, casei pela terceira vez, perdi minha mãe e a vida acabou nos distanciando, ainda assim ele me ligava de vez em quando, passava em casa para um vinho, um violão e muitas risadas e pudemos, por poucas vezes hoje lamento, estarmos mais próximos.
Separar dói. Separar de amigo, primo e pessoa tão querida como Ruy dói mais ainda.


Para- Andre, Saulo, Juliana e Carolina, vocês são como filhos prá mim.
Para- Maria, pelos anos de tantas his-estórias e risadas. Fomos felizes.

sábado, 10 de agosto de 2013

Dois em um, coisas de mercúrio





Foi bom demais ter sido uma menina rica, morar ao lado da Rua Augusta e adolescer nos anos 60/70, tudo isso ao mesmo tempo!
A "riqueza", ou pelo menos como a vejo hoje, era em todos os níveis: financeiros ( morávamos num local nobre, com conforto, com mimos e cuidados) culturais ( tinha acesso livre e irrestrito aos mais de 2 mil títulos de da biblioteca de meu pai, todos os vinis de minha mãe e suas opiniões de cinéfila quase profissional, teatros, jornais, revistas, viagens,etc, etc), de formação (num colégio que privilegiava o conhecimento e o comportamento) e, melhor, ter tido a família que tive.
Esse foi, sem dúvida, meu maior bem: o meu meio, meu núcleo, inquieto, cheio de nuances e contradições, respirando 24 hs por dia política, o mundo das ideias e ao mesmo tempo sem a rabugice ou sisudez que em geral acompanha pessoas que gostam de pensar, de legislar, etc e bônus: havia um enorme apreço por festas e diversões com igual convicção.
Meu avô, meus pais, tios, quase todos amavam jogar, frequentavam cassinos e corridas de cavalos, festeiros, engraçados e ao mesmo tempo com rígido senso de grupo e família.
Pois então que, como já contei, em 1964 os militares, aproveitando-se de bobeira geral, acabaram no poder e os bons modos e intenções do começo logo foram substituídos pela violência, abuso e perseguição nas décadas seguintes.
Optei aqui, meu blog, por não falar das coisas horríveis, tristes que aconteceram nesses anos, chamados de chumbo. Tenho um texto sobre isso.
Todos, one way or another, tem conhecimento sobre dias como esses que deveriam nunca ter existido em país algum desse planeta.
Conto apenas que meu pai, líder em SP do que chamou ( obviamente por aqueles que não o conheceram) do MDB ou de oposição " consentida" à ditadura militar, enfrentou momentos terríveis ( mesmo sendo um dos " consentidos"...) e em alguns deles pode contar única e exclusivamente comigo ( fora o pessoal do partido).
 Soube, vi e acolhi pessoas perseguidas, tinha telefones para onde ligar caso ele " sumisse" e dividi medos, incertezas e muita tristeza tentando, como ele, amenizar as dores e feridas infligidas aos que não concordavam com os que detinham o poder.
Minha salvação? Hoje, depois de tantos anos e os cursos de astrologia e ocultismo com Prof. Hélio Amorim, foi graças ao meu belo " mercúrio"!! Ou Mercúrio, para mim sempre em letra maiúscula!
O deus da dualidade, mensageiro dos deuses, o dom da fala, da estranha capacidade de não demonstrar o que pensa ou sente, de mentir...
Meu signo, Virgem- Mercúrio...Meu ascendente Gêmeos-Mercúrio...
Duas vezes abençoada por tal deus...E a isso devo tantas coisas...
E vivia, num dos meus lados, os hippies e as suaves fumaças de marijuana, o pacifismo, a delicadeza, o amor sem ser personalizado, a luz e a música, o rock...e vivia, gêmeo-irmão, também as horas escuras, os medos,as torturas, as conversas com meu pai, seus medos, as pessoas machucadas que surgiam e sumiam no nosso lindo apartamento, o Dakota, para se protegerem e desvanecerem no ar....
Só assim, de maneira dupla, dúbia, fragmentada, pude enfrentar esses anos...anos em que vi meu pai sofrer demais, chorar, se desesperar e perder a saúde...
Estranho, a menina " hippie", descalça, cheirando a patchouli, com saias coloridas e óculos amarelos era a confidente desse homem tão sério e circunspecto e de suas angústias e enfrentamentos diante de uma força tão poderosa e destrutiva.
E assim sobrevivi. e sobrevivemos. E assim esses anos ficaram para trás.
E um dia me apaixonei, um lindo músico,"guitarman" de longos cabelos ruivos, doce, meigo...e saí de lá. Mas isso é uma outra história.
Essa, a de hoje, dedico, pela proximidade de datas, a meu pai.
Íntegro, honesto, humilde e belo, como devem ser todos os guerreiros e heróis. Meu herói.


Para meu Pai, nesse dia dos Pais de 2013.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Barriga prá dentro, peito pra fora! (ou milicos e sutiãs!)






Retomo o assunto sobre os tempos em que morei no Edifício Casa Branca, Jardins-SP que chamo, carinhosamente, de Dakota, em homenagem às estranhezas e bizarrices que tornaram ambos os imóveis meio parecidos.
Mas nem tudo é tragédia e por um bônus do destino, que me percebeu tão infeliz em morar naquela gaiola dourada, pude viver e participar dos mais ricos e conturbados anos do país (e sua ditadura militar) tendo como cenário, a 5 quarteirões de distancia, a mais famosa de todas as ruas de São Paulo: a Rua Augusta!
Imortalizada em canções, estudos, teses e até hoje viva nas lembranças de quem estava lá e viu e viveu e sobreviveu para contar, essa rua representou um território livre, de conquistas, de desafios, de jovens em estado de ebulição com as ideias vindas de Londres e dos Estados Unidos e sua triste guerra do Vietnã, dos hippies, do flower power, do rock e festivais, dos ativistas e pacifistas e de uma meninada que iria mudar o rumo das coisas!
Ali usei pela primeira vez uma minissaia curtíssima! ( tão curta que não podia me sentar..rs), pois meu pai proibia ( trocava no elevador por outra saia, mais comprida, antes de chegar em casa), ali bebericava uma cuba libre disfarçada de Coca cola, ali nós, meninas e alunas do colégio feminino fino e elitista mostrávamos as pernocas ( enrolando a saia azul marinho do uniforme diante do espelho da loja de molduras que existia quase na esquina da Al. Lorena), ali admirava os motoqueiros em suas jaquetas de couro e suas Harleys roncando, ali fumávamos, ali, ali, ali...
Na Augusta onde tudo acontecia, de músicas ( na Augusta Discos, quase esquina com a Al. Tiete ou na Hi- Fi um pouco para cima lado oposto, com seus lançamentos maravilhosos de rock) às atitudes, mesmo com a vivência, às vezes tão próxima, como no meu caso, da ditadura militar, eu era feliz...
Os milicos, também chamados de "gorilas" ( pobres animais, injustiça isso), tomaram o país numa bobeira do pessoal do poder em 1964 e com mandos e desmandos, permaneceram por décadas.
No  começo meio ressabiados, eles foram ficando mais e mais truculentos e acabaram tomando gosto pelo poder e seus desdobramentos ( infelizmente, parece que fizeram escola pois alguns de seus métodos para determinados " acertos" continuam em uso). Esse pessoal era o contraponto exato ( ouso dizer, necessário) do mundo que queria e iria mudar!
Mas não é disso que quero falar, mas sim do "clima" instalado, com perseguições, proibições das mais variadas e uma sensação de medo uma vez que as liberdades individuais estavam suspensas.
Ainda assim a turma da Augusta seguia em frente e as contravenções sempre são interessantes, justamente por serem contravenções e o pessoal se reunia, ouvia rock, fumava maconha, corria da polícia, os rapazes usavam cabelos compridos e as garotas descobriam o mundo apesar das ameaças, vindas das famílias, de virarem " meninas perdidas"...
Em 1968 aconteceu o famoso episódio da " queima de sutiãs", em Atlantic City, EUA como protesto contra um concurso de Miss América que exigiu maior dignidade e menos opressão contra as mulheres. O sutiã tornou-se, então, o símbolo de opressão e "coisificação" contra mulheres.
Começava ali um movimento que se seguiu a outros tantos e marcou o nascimento de uma " nova mulher" que buscava sua liberdade e que aprendia a lutar por direitos iguais em todos os níveis.
Minha amiga Cristina Magro e eu, habilidosas nas agulhas de crochê, fizemos com linhas e lãs coloridas " sutiãs" ou "tops" cheios de charme e cores que usávamos "por cima" das camisetas Hering que comprávamos na " Meia Pataca"! Era, bem "hippie" e pacífica a nossa maneira de protestar e fazer coro contra os tais instrumentos de opressão, os sutiãs ( que nunca usávamos mesmo..rs).
Muitos anos se passaram desde 1968 e enormes mudanças vieram...
Os anos de protesto foram substituídos por um grande culto ao físico, a aparência, a tal cansativa geração academia... E sinto uma enorme melancolia...
Depois de tantas discussões, enfrentamentos, quebras de paradigmas importantes como contracepção, virgindade, igualdade no mercado de trabalho, sexo sem casamento, aborto, etc, etc, vejo a volta, pelo menos no quesito " sutiã", da " coisificação" da mulher.
Silicones de todos os tamanhos e até mesmo industriais em implantes gigantescos tornaram-se sonhos de consumo de uma parte da mulherada que corre atrás dos seios enormes, os mesmos que na década de 60/70 seriam vistos, com humor, apenas nos filmes de Fellini!
Sutiãs com armação de metal, bojos falsos, " wonderbras", tudo falso para dar a ilusão de fartura são " hits" das revistas, editoriais, moda e consumo.
Acho triste.
Não gosto de sutiãs, nunca gostei. Não tive, nunca, atributos suficientes para isso, mas não os usei nem quando grávida ( e os seios cheios), portanto... Incomodam, apertam e oprimem, independente de qualquer conotação política..rs
Me sinto, entretanto, obrigada pelo olhar inquisitório das novas gerações a esconder o pouco que tenho. Essa moçada me diz que os seios livres não são belos, que não ficam bem e que ficam vulgares sem sutiãs...
Engraçado,é como se escutasse, mais uma vez, o velho discurso de minha mãe e tias nos anos rebeldes!